OLHOS SOBRE TELA

Sunday, October 29, 2006

MOSTRA INTERNACIONAL DE CINEMA DE SÃO PAULO

A minha ausência no blog durante todos esses meses teve como motivo principal, além dos clássicos falta de tempo e preguiça de sentar aqui e dissertar sobre filmes, o fato de que nenhum filme visto ao longo deste período me mobilizou a ponto de me convencer a sentar e escrever.
Como no ano passado, o que me mobilizou foi a Mostra, que está acontecendo na cidade e deixando os cinéfilos enlouquecidos por quererem assistir tudo, o que é humanamente impossível.

Até agora consegui assistir seis filmes. Vou comentá-los abaixo na ordem que assisti:

1)A GRANDE FINAL, (ESP), Gerardo Olivares - Resquícios de Rousseau para ocidental ver

A proposta deste filme é, no mínimo, ambiciosa: mostrar em 3 cantos do mundo grupos de pessoas (índios da Amazônia, islâmicos de Marrocos e nômades do norte da Mongólia) em busca de algo comum: assistir a final da Copa de 2002, Brasil versus Alemanha. Embora sejam grupos bastante distintos culturalmente, o filme, com uma montagem inteligente e uma belíssima fotografia (e locações belíssimas) apresenta paralelamente conflitos distintos e ao mesmo tempo semelhantes girando em torno daquilo que os brasileiros chamam de "paixão nacional", mas aqui podemos chamar de "paixão internacional".
Não há dúvida de que há aqui uma estetização da pobreza e do subdesenvolvimento. Há. É um filme para ocidental ver. Nós, ocidentais, vemos e rimos daquilo que consideramos "primitivo". Rimos dos índios que não acham o lugar para ter o sinal da antena parabólica. Rimos porque pensamos: "olha como somos desenvolvidos e eles não". Será que nós somos tão desenvolvidos assim? Será que só porque temos TV a cabo para assistir a Copa e não precisamos puxar camelos podemos nos considerar superiores a ponto de rir? Estas são algumas questões que fiz para mim mesma quando terminou a sessão. Ao mesmo tempo senti neste filme um certo romantismo: os povos "atrasados" tecnologicamente possuem involuntariamente uma humanidade (?) que ocidental capitalista algum possui.

2) O ILUSIONISTA,(EUA) de Neil Burger

Ainda não aprendi que numa Mostra como essa é absurdo perder tempo com filmes americanos. Isso não significa que este filme seja totalmente perda de tempo. É uma fábula de um ilusionista que reencontra seu grande amor depois de muitos anos. O filme é tecnicamente muito bem acabado, com efeitos especiais competentes e a bela trilha de Phillip Glass. Porém creio que seja muito mais interessante LER o conto no qual o filme foi inspirado do quer assistir ao filme. Confesso que cochilei durante as irritantes vozes em off.

3)A VIDA REAL ESTÁ EM OUTRO LUGAR, de Frederic Choffat (SUÍÇA)

Uma estação de trem na Suíça e 8 vidas que se cruzam aleatoriamente. Assim poderia ser reduzida a sinopse deste longa. Uma bela crônica contemporânea. E o ambiente central nào poderia ser melhor escolhido: a estação. Quantas vidas que vêm em vão para destinos tão variados numa estação... Este filme é exatamente isso. Bem escrito, bem dirigido, bem atuado, bem fotografado e bem montado. Mais uma vez: uma bela corônica contemporânea.

4) VOCÊ DISSE QUE ME AMAVA, de Rudolph Thome (ALE)

O argumento é bastante interessante e a atuação (não lembro o nome da atriz que faz a protagonista) é ótima. Assim como "A vida real está...", este filme é uma crônica contemporânea. A história é de uma mulher, ex campeã olímpica de natação abandonada pelo marido e filha que vai em busca de um sentido em sua vida quando estava à beira do suicídio. Este tema (aliás recorrente em diversos filmes) é instigante, mas o filme podia ser um média metragem mudo. Praticamente as 2 horas de filme são os pensamentos da protagonista em off. Para quê?! Além de irritar os espectadores, essa voz em off na maior parte do tempo simplesmente narra as ações que vemos. Creio que seria muito mais interessante se ela apenas sugerisse ao invés de contar para o espectador tudo que pensa. Uma pena.

5)PAID, Laurence Hammers (HOL)

Murilo Benício no elenco - esta foi a razão pela qual assisti a esse filme. Não é nacionalismo barato não. E tenho que afirmar que o ator está exelente no papel do rapaz que, contra sua vontade, tornou-se um matador de aluguel e agora luta contra seu passado através de um garoto cujos pais foram assassinados por ele mesmo. Tecnicamente é um filme bom, bela fotografia, boa montagem, ótimo som. Mas o roteiro é cansativo. Filmes de gangsteres não são os meus favoritos.O filme é longo demais, apesar de ter somente 90 minutos de duração. Não sei. Não gostei.

6) 2:37, de Mukalli Talluri - Cruel mas necessário

Para mim foi a revelação da Mostra. Entrei na sessão sem nem fazer idéia do que veria, já que comprei o ingresso a olho de última hora. Se tivesse lido a sinopse provavelmente jamais assistiria a esse longa que apresenta a história de 6 adolescentes de um colégio australiano, cada qual com seus conflitos. No início dá a impressão de ser um "Tiros em Columbine" ou "Elefante" versão australiana. ("Elefante" é um dos meus filmes preferidos.) Mas não. O filme começa leve (até com alguns clichês) mas à medida em que a câmera que paira pelos corredores e vai penetrando no íntimo dos personagens adolescentes tão cheios de vida mas ao mesmo tempo tão angustiados e vulneráveis, o espectador vai se envolvendo de tal maneira que é impossível sair da sala de cinema indiferente.
É um filme que merece ser visto, analisado, refletido. Um filme que retrata um grupo (os adolescentes) que é esquecido quando mais precisava ser acolhido. Num determinado momento, eu me perguntava se o mundo não está como está justamente porque os adultos, quando estiveram nessa fase tão turbulenta, foram simplesmente ignorados. Mais do que isso, o filme mostra ainda como os adolescentes tratam-se e são tratados de uma forma tão cruel. Cruel como o mundo que eles virão a enfrentar - se resistirem.
Também não deixa de ser uma crônica contemporânea, mas muito mais perturbadora do que as anteriores. Um filme cruel. Mas necessário.
Poderia escrever uma tese sobre este filme. Mas vou deixar que VOCÊS assistam e me digam o que acharam.
Detalhe: o estreante diretor deste filme tem apenas 22 anos. Tem futuro.


Por enquanto é só...